ENCRUZILHADA

“Encantadores voos de imaginação acariciam-me o cérebro; mas deixo-os ali a dormitar até morrerem, pois não tenho poder para lhes dar corpo, para os transformar em coisas do mundo exterior”.

Fernando Pessoa, Escritos autobiográficos, automáticos e de reflexão pessoal

 

Dedico o poema que se segue a todas as pessoas que vivem ou já viveram duras encruzilhadas, confrontando-se com verdades profundas que, ao fim de anos, retornam à superfície para uma nova oportunidade de reflexão e de escolha.

 

ENCRUZILHADA

Vejo-me ali, dobrado em dois, na encruzilhada da estrada!

De um lado, a casa na rocha

Do outro, a promessa de um voo.

Direita, esquerda, o olhar vacila

Ansiedade no peito, grito de amor

Uma brasa nas mãos, morte contida.

O passado persegue-me como um menino assustado

Agitando como estandarte

O prazo de validade para a vertigem de um sonho!

Mas ai de mim, que o tempo não espera!

O arrepio na espinha, o susto de um choque

De frações de segundos que decidem a história.

Vivi anos em loops de imaginação!

De sonho em sonho

Bebi água no deserto

Tendo o destino previsível como certo.

Com a fantasia

Ludibriei a realidade

Que não perde nunca a oportunidade

De ser cruel em demasia

Sábia de condição!

É escandoloso ser apanhado agora, na curva do desconhecido!

O que fazer com todos estes sonhos

Caídos em catadupa no colo, feitos de corpo e pele

Hálito fresco e promessas cumpridas?

Vejo-me ali, dobrado em dois,

Engolido pelos próprios sonhos

Com a vida à espera

– Impaciente –

Louca de pressa

Para acontecer de verdade.