HOJE QUERO APENAS!

_MG_7302

Fotografia de: Maria Inês de Brito

 

O que me moveu a ser psicoterapeuta, sacrificando uma carreira na dança, foi o sonho de ajudar as pessoas a serem mais felizes. Precisei de atravessar o universo da minha própria fragilidade e aprender a aceitar o sofrimento nos olhos das pessoas e nos meus próprios olhos. É preciso que se diga que o caminho de um psicoterapeuta por devoção é solitário e exigente. Obriga-nos a ser justos. A ser compreensivos com todas as partes envolvidas. A aceitar o vazio. A respeitar o ritmo dos processos de vida. A esperar. A ser firme. A ser amoroso. A dar limites. A ser incondicional. A deixar ir. A aceitar a impotência. A tentar tudo. A irromper com lucidez. A aceitar os próprios erros e a pedir desculpa. A assumir a responsabilidade pelo vínculo. A dizer adeus com a sensação de dever cumprido. É também preciso que se diga que muitas vezes se cai de joelhos, num canto da nossa vida, para chorar as injustiças do mundo. E é disto que quero falar hoje.

Permitam-me, hoje, não escolher as palavras e não privilegiar a beleza do ser humano, como faço frequentemente nos meus textos. Hoje, dirijo-me ao lado sombrio da espécie humana e àquela vontade incontrolável de ser insensata e dar um murro na mesa. Hoje, dirijo-me também às pessoas conscientes que podem dar as mãos a muitas causas felizes e a esta também! À das crianças!

É muito difícil de aceitar que adultos façam sofrer as crianças, de forma cega e inconsequente. Uns avós responsáveis não podem raptar uma criança, arrancá-la da mãe, inventando histórias, movidos apenas pelo egoísmo. E aquele jovem pai não pode dar álcool e cigarros a uma criança de 1 ano, afirmando orgulhosamente que é assim que se forma um homem! Um vídeo com esta cena anda a circular por aí. E a justiça não pode, pura e simplesmente, centrar-se nos procedimentos e papéis e dissociar-se da dignidade humana, deixando que o tempo deixe marcas indeléveis numa criança que tem direito a ser inocente e feliz.

As pessoas mal resolvidas têm que parar de seguir mecanicamente a sua vida rotineira, movidas pelo medo de ver e de sentir, sob pena de ferirem a humanidade, em cascata! As pessoas têm que refletir sobre se estão ou não contentes com as estruturas em que vivem! E, em vez de empurrarem a vida com a barriga, morrendo devagar, têm que pedir ajuda porque não há nada mais perigoso do que exércitos de pessoas infelizes!

Uma destas muitas crianças de que falo tem 5 anos e quer ser bailarina. Todos os dias da sua vida são sonhados com esse fim, curiosamente, tal como eu quis, um dia. Fui empurrada, por uma força interior maior, para outra arte alquímica da alma, com o único e exclusivo objetivo de tentar salvar algumas inocências. E aqui estou. Sem arrependimentos, mas com a dura noção da minha impotência!

Hoje quero apenas de volta a inocência desta e de muitas outras crianças que quase só por desejarem conseguem realizar os seus sonhos, não fosse o controlo poderoso de alguns adultos transtornados pelo medo!

Que se faça justiça e que o mundo saia do vórtice de cegueira emocional! Que busque ajuda e tenha coragem de olhar, de uma vez por todas, para a sua própria Criança interna, outrora maltratada e mal amada, para assim poder interromper a cadeia repetitiva do trauma.

Hoje quero apenas expressar a minha solidariedade para com as crianças e com a Criança inocente que reside em cada um de nós!